E . M . E . R . G . I . R

Santos 2020-2021-65.jpg

Emergir // 01.01.2021
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O grito de Feliz Ano Novo ficou preso na garganta.

Nas ruas um tanto vazias, um certo consternar. No lugar dos buzinaços, dos braços ébrios erguidos e os votos anônimos de boas festas proferidos a plenos pulmões, via-se apenas algumas poucas pessoas que se atreviam a cumprimentar-se timidamente, quase constrangidas.

Outras apenas acenavam com a cabeça sem emitir nenhum som, mas era possível sentir a bondade nos olhos e o sorriso confuso por baixo das máscaras.

Do banco da calçada, imerso na massa sonora de conversas aleatórias quase murmuradas, era possível ver um casal dançando sozinhos em uma sacada toda iluminada com varais de lâmpadas enquanto em uma outra janela, uma senhora fumava sozinha no escuro.

A algazarra mais efuziva era a dos moradores de rua, que se aglomeravam debaixo das marquises das lojas fechadas - graças à gentil vista grossa momentânea da polícia - bebendo, se abraçando, com a pele calejada pela dor e a alma anestesiada pelo álcool, atravessando juntos mais uma noite ao relento...aparentente imunes, inclusive à melancolia.

Dessa vez a explosão de alegria ficou muda, uma esperança tímida não teve forças sequer para comemorar aliviado um "Adeus, 2020" como se isso significasse alguma coisa além de uma convenção, da Terra dando mais uma volta ao redor do Sol, do tempo passando e da vida acontecendo independente do nosso controle.

O reinício do ciclo, assim como os seus significados, só cabe a nós atribuir...devendo acontecer no nosso tempo. E se a palavra de ordem no momento é CORAGEM - palavra que tem sido gritada para mim de muitas maneiras - eu começo o ano de mãos dadas com ela ao externalizar tudo isso.

Para poder emergir, por hora me esvazio...sem me punir, procurando sem pressa e sem pausa construir em mim o sentido de que só o vazio pode abrir espaço para um novo preencher.

Caio BragaComment